Tribunal Constitucional
No penúltimo dia possível para a promulgação da polémica lei da abolição das portagens na auto-estrada do Oeste, entre Torres Vedras e o Bombarral, o Presidente da República decidiu segunda-feira pedir ao Tribunal Constitucional a fiscalização preventiva do diploma. Uma lei que foi aprovada por todos os partidos da Oposição contra a vontade do PS e do Governo.
Francisco Assis, presidente do Grupo Parlamentar do PS, comentou a decisão do chefe de Estado e disse que os socialistas sempre consideraram que o diploma dos partidos da Oposição estava ferido de inconstitucionalidades. O líder da bancada socialista, no entanto, recusou-se a considerar uma vitória do partido o facto de o Presidente da República ter optado por solicitar a fiscalização preventiva da lei.
Justificando as dúvidas levantadas ao Palácio de Belém, a Casa Civil de Jorge Sampaio explica que a abolição das portagens levanta dúvidas em matéria de separação de competências entre a Assembleia da República e o Governo. O articulado, acrescenta-se, «situa-se num domínio de fronteira de competências não facilmente determináveis». O acto do chefe de Estado é ainda explicado como uma forma de prever «malefícios da publicação de actos legislativos inconstitucionais, designadamente daqueles cuja entrada em vigor produziria, de imediato, consequências dificilmente reparáveis».
Na nota emitida pela Presidência da República, frisa-se,
ainda, que importa apurar e determinar a quem cabe a competência
de abolir portagens, se ao Governo, enquanto órgão de condução
de política geral do país e órgão superior
de Administração Pública, se à Assembleia da
República, enquanto órgão legislativo supremo».
Guterres e Gama satisfeitos
Definitivamente, o combate ao desemprego vai tornar-se no terceiro grande pilar político da União Europeia. Após a cimeira extraordinária do Luxemburgo, os chefes de Estado e de Governo dos «Quinze» decidiram dar prioridade à resolução de um drama social que afecta 18 milhões de cidadãos europeus. Em termos de perspectivas financeiras da comunidade, até 2006, o Governo de Guterres conseguiu fazer prevalecer as suas posições fundamentais: o objectivo da União Europeia terá em conta o princípio da empregabilidade (nível de qualificação, formação e inserção no mercado de trabalho) e não apenas a taxa de inflação de cada Estado-membro.
No final da cimeira do Luxemburgo, o primeiro-ministro mostrou-se extremamente satisfeito com os resultados obtidos, já que, na sua opinião, vão possibilitar um conjunto de estratégias, medidas concretas e objectivos quantificados para o combate ao desemprego e para a melhoria da qualificação profissional da generalidade dos cidadãos europeus. Embora as medidas aprovadas ainda não possam ser quantificadas, António Guterres, porém, esclareceu que o Conselho Europeu deu um primeiro e importante passo num «caminho que não está totalmente percorrido».
Para as ambições nacionais, foi extremamente importante que os dinheiros para o combate ao desemprego, nos próximos anos, não sejam transferidos a partir dos actuais programas comunitários, conservando-se assim intactas as aspirações nacionais de manter ou aumentar o presente nível de afluxo de fundos estruturais às regiões mais pobres da União Europeia. Por seu turno, o ministro dos Negócios Estrangeiros realçou o triunfo das posições portuguesas em dois outros pontos fundamentais. Em primeiro lugar, os «Quinze» chefes de Estado e de Governo aceitaram consagrar a perspectiva da empregabilidade, ou seja, privilegiar factores como a inserção profissional dos cidadãos de cada país. Em segundo lugar, a estratégia de promoção de novos postos de trabalho terá como base um conceito mais lato do que a taxa de desemprego. Se somente a taxa de desemprego fosse levada em linha de conta, recorde-se, Portugal seria prejudicado, porque apresenta uma reduzida taxa (pouco mais de seis por cento), sobretudo, em comparação com países como a Espanha, Itália, Alemanha e França.
O Conselho Europeu, que reuniu no Luxemburgo, decidiu equiparar o emprego à política económica, embora respeite as diferenças entre cada um dos dois domínios e as situações específicas de cada Estado-membro. Haverá, no entanto, vontade política para serem seguidos objectivos em comum, que serão verificáveis e regularmente actualizados. Depois, as directrizes fixarão objectivos concretos no combate ao desemprego, cuja realização será regularmente acompanhada segundo um processo comum de avaliação dos resultados. Para 1998, as directrizes articulam-se em torno de quatro eixos principais: melhorar a empregrabilidade, desenvolver o espírito empresarial, incentivar a capacidade de adopção dos trabalhadores e das empresas, e reforçar a política de igualdade de oportunidades no mercado de trabalho.
Ainda por analogia com a convergência económica da União Europeia, os Estados-membros terão de transmitir anualmente ao Conselho Europeu de ministros e à Comissão Europeia os seus planos de acção nacional para o emprego -- planos que serão acompanhados de um relatório sobre as condições de aplicação. Posteriormente, o Conselho fará uma análise da forma como os governos nacionais procederam à transposição de directrizes para as suas políticas e apresentará por sua vez um relatório.
Outra decisão importante da cimeira do Luxemburgo é o facto de, a partir de agora, «num prazo a fixar por cada Estado-membro, e que não poderá exceder cinco anos -- podendo ser superior nos países com um desemprego particularmente elevado --, os governos nacionais terão de actuar de forma a proporcionar uma nova possibilidade de trabalho a todos os jovens antes de completarem seis meses de desemprego, sob a forma de formação, reconversão, experiência profissional, de emprego ou de qualquer outra medida adequada para favorecer a sua inserção profissional; terão de proporcionar igualmente uma nova possibilidade aos desempregados adultos antes de completarem 12 meses de desemprego por um dos meios atrás referidos ou, de um modo mais geral, através de um acompanhamento individual de orientação profissional.
Finalmente, os chefes de Estado e de Governo concordaram no sentido
de que cada país procure aumentar sensivelmente o número
de pessoas que beneficiam de medidas activas capazes de facilitar a sua
inserção profissional. Com o objectivo de aumentar a percentagem
de desempregados a quem é proposta uma formação, haverá
principalmente que fixar uma meta. Uma meta que se estabelecerá
em função da situação de partida de cada país,
da aproximação progressiva de cada país à média
dos três Estados-membros com melhores desempenhos. Nas suas políticas,
cada Estado-membro terá de abranger, pelo menos, 20 por cento do
total de desempregados.
Guterres resolveu remodelação
rapidamente
O inesperado pedido de demissão de António Vitorino -- unanimemente considerado um acto de grande dignidade --, obrigou António Guterres a antecipar a reestruturação da sua equipa, que se encontrava já prevista mas para mais tarde. Um difícil desafio político que, no entanto, foi resolvido rapidamente, em menos de 48 horas. As mudanças operadas em alguns dos ministérios, segundo o primeiro-ministro, vão permitir proporcionar ao Executivo socialista maior eficácia e um aumento da capacidade de intervenção política. O chefe do Governo deixou ainda palavras de sincero agradecimento pelo contributo, empenho e dedicação, ao longo de dois anos, dos ex-ministros Maria João Rodrigues, Augusto Mateus, Alberto Costa e António Vitorino.
O primeiro-ministro apresentou ao Presidente da República, na segunda-feira, no Palácio de Belém, a nova equipa do seu Governo. Na audiência com o chefe de Estado, explicou também as razões para a súbita remodelação operada na véspera, domingo. António Guterres disse a Jorge Sampaio que apenas ponderava proceder a alterações no Executivo no mês de Janeiro, mas o inesperado pedido de demissão de António Vitorino, que quinta-feira abandonou as pastas da Defesa e da Presidência, obrigaram-no a tomar um decisão rápida.
Logo que tomou conhecimento do pedido de demissão do ministro da Presidência e da Defesa, o primeiro-ministro afirmou estar muito «consternado», enaltecendo as qualidades do seu colega de Governo e «camarada» de partido. Estas palavras foram proferidas na madrugada de sexta-feira, após a primeira reunião do Conselho Europeu extraordinário, no Luxemburgo. Depois, em menos de 48 horas, António Guterres conseguiu encontrar uma solução para a substituição de um dos elementos mais importantes do Executivo. Chamou o experiente Veiga Simão, ex-ministro da Indústria de Mário Soares, para assumir a pasta da Defesa, enquanto António Costa passou de secretário de Estado para ministro dos Assuntos Parlamentares.
Mas verificaram-se ainda mudanças na Administração Interna. Jorge Coelho é o novo responsável por esta área governamental, acumulando-a com os sectores da Comunicação Social e da Administração Pública. O primeiro-ministro decidiu, igualmente, que Ferro Rodrigues acumulará a pasta do Emprego e da Qualificação Profissional, até agora da responsabilidade de Maria João Rodrigues. Outras novidades relevantes no elenco de António Guterres são as transferências de Pina Moura para a Economia, substituindo Augusto Mateus no cargo de ministro, e de António José Seguro para secretário de Estado Adjunto do primeiro-ministro. No âmbito desta reestruturação foi também criado o novo Ministério da Juventude, Desporto e Combate à Toxicodependência, que terá em José Sócrates o seu responsável máximo.
Após dar conhecimento do conjunto de alterações a Jorge Sampaio, no final da audiência, quando abandonava o Palácio de Belém, António Guterres deixou bem claro que a acção governativa vai prosseguir normalmente, eliminando assim qualquer ideia de perda de força da sua equipa. Por outro lado, sublinhou que os portugueses têm agora maiores razões para ter mais confiança neste Executivo, porque sabem, que, «quando surgem problemas, eles são resolvidos rapidamente. A estabilidade do país está garantida e a tranquilidade assegurada», declarou.
Interrogado sobre a natureza das mudanças operadas, o chefe do Governo mostrou-se confiante de que a nova equipa será «mais eficaz», tendo mesmo sido reforçada a sua capacidade de intervenção de ordem política. Aproveitou, até, para negar um eventual apagamento do espírito de abertura dos «Estados Gerais». Espírito que se reflectiu numa maior abertura a cidadãos independentes e à sociedade civil, estando na origem da vitória do PS em 1995. António Guterres lembrou, a este propósito, que abandonaram o Governo dois ministros independentes, tantos quantos foram os ministros socialistas que saíram nesta reestruturação.
O Governo, porém, viveu um momento difícil quando António Vitorino tomou a decisão de abandonar as suas funções governativas, quinta-feira, um dia depois de ter sido contactado pelo jornal «Público», que pretendeu pôr em causa a legalidade de um acto da sua vida privada, ocorrido em 1989, por ocasião de uma aquisição de um terreno no Alentejo. Tendo a ouvi-lo Jorge Coelho, António Costa, Vitalino Canas e António José Seguro, o ex-ministro da Presidência explicou que verificara que, nessa transacção, a liquidação da sisa a que efectivamente procedeu se reportava a uma parte do valor da transacção (três mil contos, valor declarado na escritura), correspondendo à sua parte rústica e não ao custo total da mesma (7500 contos) por considerar que a componente urbana estava isenta.
«Foi esta, em consciência, a minha motivação, e tenho a profunda convicção, hoje e como então, de que agi de forma em que os interesses patrimoniais do Estado não foram em nada lesados». Em todo o caso, realçou, «em democracia, ninguém está acima de toda a suspeita». Aquilo que está em causa, acrescentou, «é a observância de um princípio de respeito pelo cumprimento das obrigações fiscais que impende sobre todos os cidadãos, esteja em causa um tostão ou um milhão. O meu juízo é de natureza estritamente pessoal. Pela forma como sempre me conduzi na actividade política, julgo impossível exercer funções públicas ao meu nível debaixo de qualquer suspeição», disse.
A finalizar, alegando não ser possível a figura da suspensão de funções, entendeu, «em consciência, não dever prosseguir no exercício do cargo. Retomo, assim, a minha qualidade de simples cidadão para, sem o benefício de qualquer imunidade, promover o cabal esclarecimento da minha situação junto da Administração Fiscal e proceder à sua regularização integral se se apurar o contrário». Até a esse momento, vincou, «não exercerei qualquer função política».
Com as alterações verificadas no Executivo, e mais directamente por causa das novas responsabilidades de Jorge Coelho na pasta da Administração Interna, António José Seguro assumirá a coordenação do partido dentro da Comissão Permanente e no processo eleitoral para as autárquicas. António Galamba também verá as suas responsabilidades alargadas nos órgãos dirigentes do PS.
Quanto aos novos secretários de Estado, para a Cooperação entra Luís Amado, que assim abandona funções na Administração Interna, enquanto Maria José Constâncio aceitou o convite para a área do Desenvolvimento Regional. Luís Parreirão, ex-chefe de gabinete de Fausto Correia, assume uma das secretárias de Estado no Ministério da Administração Interna, tendo ao seu lado Armando Vara. Para o Ministério da Economia, Pina Moura escolheu uma equipa totalmente nova: Vítor Ramalho será adjunto; no Comércio estará Osvaldo Castro, até hoje vice-presidente da bancada socialista, nas pastas da Indústria e da Energia Fernando Pacheco, e no Turismo Cabrita Neto foi a opção do ex-secretário de Estado Adjunto de António Guterres.
No Ministério da Saúde, Francisco Ramos substitui Arcos dos Reis como secretário de Estado. E José Guerreiro ocupará o sector anteriormente da responsabilidade de José Sócrates no Ambiente. Com a fusão das áreas do Trabalho da Segurança Social e da Solidariedade, Ferro Rodrigues chamou o jovem Paulo Pedroso para seu adjunto. Paulo Pedroso, presidente da Concelhia do PS/Almada, era responsável pela gestão e aplicação do rendimento mínimo garantido no gabinete de Ferro Rodrigues.
Entretanto, com a criação do Ministério do Desporto, da Juventude e Toxicodependência, José Sócrates continuará a contar com Miranda Calha nas questões ligadas ao Desporto, tendo chamado Miguel Fontes, ex-assessor de António Guterres, para preencher a vaga deixada em aberto por António José Seguro na Secretaria de Estado da Juventude.
No Ministério da Defesa também se verificaram alterações.
José Penedos que detinha no Ministério da Economia
a pasta da Indústria e Energia, transitou para a Defesa, sendo o
novo secretário de Estado da Defesa
Minorias Étnicas
«Prevenção do racismo no local de trabalho - da teoria à prática», foi o tema da conferência que decorreu, no início desta semana, em Lisboa.
Tratou-se de uma iniciativa organizada no âmbito do Ano Europeu contra o Racismo, pela Fundação Europeia para a Melhoria das Condições de Vida e de Trabalho, com o apoio do Alto-Comissariado para a Imigração e Minorias Étnicas.
O Presidente da República, Jorge Sampaio, que presidiu à abertura da conferência, relembrou que os portugueses, pelo seu passado, conhecem bem os dois lados dos problemas que se põem aos trabalhadores que emigram e imigram, razão pela qual, afirma, «os portugueses têm especiais razões para combater com coragem» e determinação os efeitos do racismo e da xenofobia.
A conferência que teve por objectivo a identificação das estratégias adequadas para desenvolver as boas práticas na prevenção dos flagelos do racismo e da xenofobia, contou com a participação de representantes da Confederação Europeia dos Sindicatos (CES), da União Europeia das Confederações Patronais (UNICE) e do Centro Europeu das Empresas Públicas (CEEP).
Durante dois dias foram apresentados e debatidos estudos realizados nos diferentes Estados-membros da União Europeia, sobre a eliminação da discriminação e da promoção da igualdade de tratamento no local de trabalho.
O relatório sobre «Prevenção do Racismo nos Locais de Trabalho em Portugal», apresentado durante a conferência, reconhece a existência de um esforço no sentido da integração das minorias étnicas, para o qual a política adoptada pelo actual Governo tem contribuído decisivamente.
José Leitão, alto-comissário para as Minorias Étnicas, referiu, na sua intervenção, que a adopção de políticas de não discriminação são uma mais-valia para as empresas, adiantando que ter pessoas das mais variadas origens, com diferentes percepções, constitui uma vantagem competitiva para as empresas em sociedades pluriculturais como as existentes actualmente.
Segundo José Leitão, a conclusão fundamental a reter desta conferência é a que «há, ainda, muito a fazer no combate à discriminação» e que a sua eliminação contribui para uma maior coesão na integração social. Para o alto-comissário, o combate à discriminação tem de começar pela eliminação da discriminação legal, porque, sublinhou, sem a via legal não é possível pensar-se na eliminação de outras discriminações.
A este propósito, José Leitão considerou que sindicatos, entidades empregadoras, organizações de carácter social, quer a nível nacional, quer a nível internacional, com particular destaque para os Estados-membros da UE, são parceiros privilegiados para a continuação do combate pela igualdade de tratamentos no local de trabalho.
Relativamente a Portugal, José Leitão considerou que existem empresas que utilizam «boas práticas», saliantando, a este propósito, o Acordo Social da Expo'98, pois prevê, entre outras medidas, o impedimento da utilização de trabalho ilegal, a criação de um intercâmbio de emprego e formação profissional e medidas para promover a segurança, higiene e saúde no trabalho.
(JMV)