LIBERDADE DE EXPRESSÃO 



A AGENDA 2000

MANUEL DOS SANTOS

Na sequência da Cimeira Europeia de Amsterdam, a Comissão foi encarregada de elaborar um estudo sobre as profundas modificações, decorrentes do novo Tratado, no processo de construção europeia.

Este estudo, complexo e detalhado, veio a ser posteriormente apresentado aos parceiros europeus sob a atractiva designação de Agenda 2000.

O actual processo de transformação europeia é particularmente sensível e, potencialmente delicado, para os parceiros mais frágeis da União.

Neste contexto a primeira resposta que a Europa tem a dar é a resposta do alargamento.

Um dos princípios fundadores da Europa é, inequivocamente, o da universalidade o que significa que o espaço europeu não pode transformar-se num clube de ricos ou de eleitos.

Todos aqueles que revelarem interesse em aderirem, se respeitarem as condições de entrada, não podem deixar de ser acolhidos na família europeia.

É por isso que são candidatos, neste momento, onze novos países: a Bulgária, a Estónia, a Hungria, a Letónia, a Lituânia, a Polónia, a República Checa, a Roménia, a Eslovénia, a Eslováquia e Chipre.

Quando se verificar, este será o maior alargamento de sempre da Comunidade, que passará assim dos actuais quinze membros para vinte e seis parceiros.

Só que o segundo princípio fundador da Europa, reforçado com o Tratado da União Económica e Monetária, é o da coesão económica e social o que implica, por um lado, o estabelecimento de ajudas de pré-adesão aos países aderentes e posteriormente, a consagração do princípio de apoio para correcção de assimetrias regionais nos termos dos regulamentos aplicáveis dos fundos estruturais.

Tudo isto surge numa altura em que a própria União se questiona sobre o seu financiamento e se orienta, cada vez mais, no sentido de uma maior restrição orçamental.

É pois neste aspecto que reside o perigo potencial para os países mais débeis da União.

O alargamento, que todos desejam, não pode ser feito à sua custa.

No caso português, a situação parece bem clara.

A opinião pública defende a expansão da Europa, na medida que tal implica mais democracia e estabilidade, mas exige a continuação das políticas de coesão, indispensáveis para eliminar as diferenças ainda existentes no desenvolvimento e no bem estar dos povos.

A ratificação, a ocorrer brevemente, do tratado de Amesterdam e o próprio referendo sobre questões europeias que, provavelmente, virá a realizar-se durante 1998, ocorrerão dentro deste quadro e com este entendimento.

O Governo e os parceiros sociais têm de revelar posições comuns que permitam afirmar e defender inequivocamente os nossos interesses.

O crescente protagonismo de Portugal, na agenda da Europa, e o respeito político que o actual Governo soube conquistar são uma base de garantia para que tais objectivos sejam atingidos.



FEDERALISMO URGENTE

CARLOS ZORRINHO

A visão federalista da construção europeia foi proscrita do debate sobre a Europa, ao mesmo tempo que as redes federadas de empresas, universidades e instituições múltiplas vão ganhando fulgor e traçando no terreno uma malha irrevogável de «partenariados» supranacionais.

O tratado de Amsterdão configura uma miscelânea de opções institucionais cruzando dimensões federalistas com perspectivas intergovernamentais, confederalistas e mesmo interparlamentares. Em paralelo, a União Económica e Monetária traduz um exemplo claro duma integração federada das economias que nela se integrarem.

Não tenho uma visão jurídico-normativa da realidade em geral, nem da construção europeia em particular. A dinâmica dos sistemas complexos pode ser moldada mas nunca totalmente controlada pelo quadro regulamentar. O carácter inacabado de alguns domínios insuficientes do Tratado da União Europeia deve ser visto mais como um desafio à sua evolução permanente, do que como uma limitação ao desenvolvimento do espaço económico, social e político europeu.

Há, contudo, uma falha grave no conteúdo do Tratado da União Europeia na sua versão aprovada em Amsterdão. Trata-se da ausência bloqueadora duma visão federadora do futuro e dum projecto político comum aos quinze países da União. Há por isso um federalismo que urge na construção europeia... O federalismo das ideias!

A visão política do futuro da União Europeia deveria constar do preâmbulo do Tratado de Amsterdão, explicitando o caminho, o conjunto de valores partilhados, as opções geoestratégicas, o empenhamento democrático e as apostas de cidadania. Mas o preâmbulo é omisso. Tão omisso que não existe!

A ausência de dimensão política explícita no Tratado de Amsterdão coloca outras questões relevantes, merecedoras de reflexão. Por exemplo, não havendo um sentido político explícito, o que é que se referenda quando se plebiscita o Tratado ou temas associados a esse Tratado e às suas consequências? Convalida-se um conjunto de normas ou pelo contrário, o que é avaliado é a interpretação pragmática que cada governo faz dessas normas e as consequências directas ou indirectas da prática governativa em cada país membro?

A fortíssima maioria de portugueses que previsivelmente votarão Sim no referendo europeu previsto em Portugal para a próxima Primavera, mais do que avaliar os méritos da Conferência Intergovernamental, reflectirão o seu agrado pela gestão política do País feita no contexto europeu. Daí não advirá mal ao mundo, mas importa ter plena consciência do enviezamento, para tirar todas as ilações do resultado obtido.

Ouvi há dias na Comissão Institucional do Parlamento Europeu o deputado trabalhista galês Axei Anderson caracterizar a Europa da União como um navio à deriva, onde marinheiros de quinze países cooperam para sobreviver sem rota definida nem porto de referência. E à volta do navio botes de mais uma dezena de países procuram embarcar a sua tripulação no navio sem norte!

Chegou a hora de dizer basta à indefinição e à vertigem tecnocrática, que esta imagem tão bem retrata. Talvez não seja este o tempo de federar poderes no espaço da União, mas federem-se então preambularmente as ideias, pois a Europa está carente duma visão política mobilizadora.

Quem assume a paternidade dessa visão? Quem tiver o engenho e a arte de o fazer ombreará com Monnet e Delors na galeria dos grandes obreiros do século.




... UMA OPÇÃO POLÍTICA!

COSTA TEIXEIRA *

Aqui há dias, no telejornal das 20 horas do dia 21 de Outubro, ouvimos o Dr. Pacheco Pereira afirmar, durante uma conferência de Imprensa organizada com pompa e circunstância e com a presença do Eng. Ferreira do Amaral, o seguinte: «Tudo o que está acontecer nada tem a ver com os azares da natureza, mas com uma opção política.»

Referia-se, então, ao forte temporal que assolou a capital naquele fim-de-semana.

Estou certo que disso deram conta os órgãos de Comunicação Social que acompanharam a conferência de Imprensa, mas não me recordo de ter lido qualquer referência sobre aquele pensamento fabuloso que terá de ficar na história daqueles que continuam a agir como se ainda fossem poder.

Estamos já cansados deles e das suas diatribes.

Da acção política, em democracia, o que menos gosto é do elevado grau demagógico que certos políticos imprimem às suas afirmações inconscientes e pela gestão do silêncio, quando deviam, isso sim, vir para a praça pública tecer críticas às suas próprias omissões e, como pessoas livres, à actuação do seu próprio partido.

A sua atitude deixa pressupor, naturalmente, a discordância de pontos de vista entre partidos e políticos que confrontam as suas ideias democráticas numa lógica de jogo e não de consenso.

Posto isto direi quanta tristeza sinto por ter ouvido o meu conterrâneo Dr.

Pacheco Pereira, pessoa que considero inteligente, proferir tamanha «calamidade».

Como então o Governo, o PS, ou o Presidente da Câmara Municipal de Lisboa, Dr. João Soares, fez um acordo (mais um dos célebres acordos a juntar aos do Dr. Marcelo), com os satélites meteorológicos para espalhar naqueles dias tanta desgraça em Lisboa e logo numa altura nada conveniente porque vêm aí as eleições autárquicas.

Será que também haverá a mãozinha dos políticos na tromba de água que se abateu sobre a região de Monchique, concelho do interior do Algarve? Isto é de bradar aos céus.

Como é possível afirmar que aquela tromba de água resulta de «uma opção política»?

Mas se é uma opção política de quem é ela?

Certamente que só pode ter sido do PSD e do Presidente da Distrital de Lisboa.

De facto, fico com a sensação que já anda noutra galáxia, pois não creio que esteja a perder as faculdades que tanto o notabilizaram noutros tempos.

Temos de estar atentos e saber denunciar no momento próprio os erros democráticos dos adversários políticos.

Dr. Pacheco Pereira: reconheça o seu erro.

* Autarca




A PRINCESA, O ACIDENTE AS LEIS

JOSÉ NEVES

Um mês após o fatídico acidente que custou a vida à Princesa Diana e a mais duas pessoas, e depois de termos assistido a programas em que também nos pareceu «... que o mundo, de repente, perdeu o senso», foi reconfortante ler no «Expresso», na coluna da página três («A princesa encantada», edição de 27/9), uma análise que aponta para a verdadeira causa do mito Diana. É uma lúcida análise que desmonta uma das hipocrisias da devoção a Diana pelo «... seu interesse pela causa dos pobres, dos doentes e dos desprotegidos». Pois como ficou bem demonstrado, só a veneram pelas suas particularidades de estética e de realeza. Uma outra hipocrisia, já denunciada, entre outros, pela Presidente do Sindicato dos Jornalistas, Diana Adringa, e que não é de mais referir, trata-se da condenação histérica que se fez dos «paparazzi», quando estes mais não fazem do que obter imagens para saciar os milhões de ávidos consumidores em todo o mundo. Não obstante reconhecer-se o inalienável direito à privacidade de cada um, o que pressupõe que essa actividade dos fotógrafos e jornalistas seja devidamente regulamentada.

Há ainda outro aspecto deste inimaginável acidente que não pode deixar de merecer a nossa reflexão. Trata-se da alta velocidade, como referem «... a 200 quilómetros à hora pelas ruas de Paris ...», a que foi permitido, «irresponsavelmente», que o carro circulasse. Ora esta foi, sem dúvida, a causa directa do acidente, mas a que muitos, obstinadamente, persistem em ignorar para inculpar outros. Os poderes constituídos criam leis e códigos para regular o funcionamento mais adequado da sociedade. Mas os poderosos deste mundo julgam-se acima das leis, desrespeitando o que foi regulamentado para benefício e respeito de todos, só porque com o seu estatuto de poder conseguem quase sempre a impunidade. Impunes perante as leis dos homens mas não perante a lei da física. Foi o caso. O embate do potente Mercedes num pilar de betão, àquela velocidade, não poderia ter outro resultado. E se, pelo menos, a colocação dos cintos de segurança tivesse sido respeitada, talvez o resultado não fosse tão trágico. O único sobrevivente parece ter cumprido essa regra elementar de segurança. Já nem falamos na embriaguez do condutor que, por certo, não seria tão evidente aos ocupantes da viatura. Enfim, este conjunto de infracções, com consequências tão nefastas, deveriam ser ponderadas por todos para o rigoroso acatamento das disposições legais. E também deixar-nos a reflexão de que nem mesmo os mais poderosos deste mundo se devem eximir ao cumprimento das leis. Para a sua e nossa segurança!