LIBERDADE DE EXPRESSÃO



OS «SEM-LUZ» DE FONTE DE MOURO

António Saleiro

O Baixo Alentejo tem sido palco de alguns factos importantes para quem acompanha atentamente o processo de desenvolvimento do «País real». Este onde se descobrem as dificuldades do passado, se faz hoje tanto pelo progresso que na mesma semana ouvimos assobios e foguetes, e onde se constroem os cenários de esperança para o futuro!

Fonte de Mouro, um dos aglomerados rurais existentes no concelho de Beja, esquecido durante anos a fio e só lembrado por alturas das campanhas eleitorais, esteve em festa. Ou melhor, recebeu em festa os homens que lhe prometeram numa noite fria e «à luz» da caravana, vai para ano e meio, que uma vez eleitos tudo fariam para que fosse desbloqueado o processo de electrificação das suas casas. E que processo! Tão grande e tão contraditório, no passado, que se fossem contados os «timings» não cumpridos fariam corar de vergonha os que nos acusam de ser lentos a tomar medidas!

Ora, muitas das pessoas dessa caravana da Nova Maioria que cruzou uma noite o Bairro da Esperança (outra «pérola» que a futura gestão do Dr. Agostinho Moleiro terá de resolver, porque não tenho dúvidas que ele confirmará nas urnas os desejos de vitória socialista que, a toda a hora, ouvimos nas ruas!), essa caravana simbólica, investida agora de funções governativas, voltou lá uma destas noites. Levámos o Ministro da Agricultura, que assistiu à ligação da electrificação, enquanto as rádios, jornais e televisões mostraram ao País e ao Baixo Alentejo que há homens de palavra, que o vento da História sopra no sentido do progresso, que esta Nova Maioria sabe trabalhar em prol das populações e das suas causas justas.

Os foguetes, a alegria de muitas famílias poderem aspirar à «qualidade de vida» dos outros portugueses, foi notícia. Grande notícia, até porque provou que urge modificar também a insensibilidade a outros níveis do Estado...

Essa festa ficou por conta do povo de Fonte de Mouro, que agradeceu o nosso trabalho sinceramente. Não eram lavradores que falavam connosco. Eram, se podemos dizer assim, os verdadeiros «sem-terra», ou «sem-luz» no caso, que nunca estiveram envolvidos pelos «sindicatos» da classe, nem pelos associados da Confederação.

Mas podem ter a certeza de que eram em maior número do que aqueles que, dias antes, tiveram a agenda livre de compromissos daquelas «coisas» que dão sempre lugar reservado nas cerimónias, e passaram a tarde ao sol a lamuriar contra o ministro, às portas do Governo Civil.

Em Fonte de Mouro, ou em Moura (onde Gomes da Silva apresentou o plano de modernização do sector do Azeite elogiado pela CAP), até descobrimos caras de alguns que tiveram a sorte de herdar hectares de terras por estas bandas... e que tinham estado na «manif» anti-Gomes da Silva, mas se esqueceram de ir à festa daquela gente «sem-luz» que nasceu, vive e morrerá ligada à agricultura... 

ÚLTIMA COLUNA

Joel Hasse Ferreira

A recente reunião do ECOFIN (Conselho de Ministros da Economia e Finanças da União Europeia), realizada em 12 Maio último, tendo apreciado o Plano de Convergência, Estabilidade e Crescimento aprovado pelo Governo português em Março passado, conduz-nos à necessidade de sublinharmos alguns aspectos essenciais da evolução recente e prospectiva no domínio das finanças públicas, do desenvolvimento económico-social e das reformas sociais e políticas.

É muito positiva a evolução verificada ao domínio do crescimento económico, ultrapassando as expectativas mais optimistas, embora se compreendam as reservas que alguns põem quanto à possibilidade de se verificar uma maior aceleração desse crescimento em anos próximos.

De qualquer forma, já ninguém de bom senso ou conhecedor das questões financeiras, põe em causa a elevadíssima probabilidade de se vir a obter em 1997 um défice inferior a 3% (o Orçamento de Estado aprovado na AR propõe 2,9%), o qual será ainda mais reduzido nos anos de 98, 99 e 2000.

Em qualquer caso, a conjugação do aumento bem orientado dos investimentos públicos com um moderado aumento da procura (proveniente nomeadamente do moderado acréscimo dos salários reais, do aumento das capacidades exportadoras e da retoma verificada em diversas economias europeias) permite consolidar expectativas positivas de evolução económica.

Na nossa perspectiva, tendo em conta o Plano de Convergência elaborado pelo Governo português e a posição que sobre ele tomou o ECOFIN, é importante relembrarmos a necessidade de prosseguir algumas reformas e incentivar outras.

As reformas da saúde e da segurança social aparecem recomendadas como urgentes pelo ECOFIN, sublinhando-se assim as referências que lhes eram feitas nos Planos de Convergência, Estabilidade e Crescimento. No domínio fiscal, está em marcha também um processo de reforma, governamentalmente preparado e a qual a condição parlamentar em curso abre caminho.

Importa ainda relembrar o anúncio feito esta semana de se ter atingido a inflação mais baixa desde há muitas décadas, o que é muito positivo, nomeadamente quando conjugado com crescimento económico actual e previsível. 

«BOYS» E «GRILS»
SECRETÁRIO DE ESTADO LANÇA REPTO A LÍDER DO PCP

J. C. Castelo Branco

«Quem não se sente não é filho de boa gente» e «quem não deve não teme» são bons exemplos de ditados populares para ilustrarem as razões que assistiram ao secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, António Carlos dos Santos, para escrever uma carta ao líder do PCP, Carlos Carvalhas.

Em causa estão as afirmações públicas recentes do sucessor de Álvaro Cunhal em que acusa o governante de ter procedido à nomeação de um número considerável de «boys» para cargos dirigentes da administração tributária, dos quais 11 directores de serviço e 28 chefes de divisão, sem concurso público, isto é, sem esperar pela entrada em vigor da lei que obriga aqueles dirigentes a serem nomeados por concurso.

Não obstante o Ministério das Finanças sobre o tema das nomeações já ter emitido uma nota à Imprensa, o secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, na carta enviada a Carlos Carvalhas, sublinhou que dadas as referências à sua pessoa justificam-se algumas observações complementares quanto à sua «legalidade, oportunidade e mérito».

Quanto à legalidade, António Carlos dos Santos afirma: «penso que V. Exa. não pôs em dúvida - nem poderia seriamente pô-lo - a legalidade das nomeações. Estas foram efectuadas ao abrigo das leis orgânicas vigentes na DGCI e na DGAIEC. O texto da nova lei, recentemente aprovada no Parlamento, ele próprio, exclui expressamente qualquer aplicação retroactiva, ao estatuir que "o presente diploma apenas se aplica aos titulares dos cargos dirigentes nomeados após a sua entrada em vigor".»

Na missiva enviada ao líder do partido da Soeiro Pereira Gomes, e no que concerne à oportunidade, o governante esclarece que «a nova lei terá ainda que ser promulgada e publicada, factos que normalmente demoram cerca de mês e meio a dois meses».

«A seguir-se a sugestão de V. Exa. de esperar pela nova lei para se efectuarem as nomeações, refere o secretário de estado, na melhor das hipóteses só teríamos dirigentes em efectividade e plenitude de funções no início do próximo ano».

Para o governante, «só quem não esteja interessado em que o OE/97 seja cumprido, só quem não esteja interessado em que o volume das receitas fiscais previsto seja atingido, poderá contestar a medida por razões de oportunidade».

Quanto ao mérito, o secretário de Estado na carta dirigida ao líder dos comunistas esclarece que «as pessoas que foram nomeadas para aqueles cargos foram-no por mérito próprio e não por serem "boys" ou "girls" do PS».

«Não tendo do exercício transitório do poder - por muito que isto possa ser estranho para quem porventura esteja habituado a funcionar noutro registo - a visão instrumental de que o aparelho de Estado deve ser objecto de assalto e conquista por forças partidárias ao serviço das quais deveria estar e, pelo contrário, subscrevendo a ideia de que a administração visa efectivamente a prossecução imparcial do interesse público, a V. Exa., tão apressado na impensada denúncia pública de factos que, a meu ver, conhece mal, faço pois um repto: que indique publicamente quem são os dirigentes nomeados por esta Secretaria de Estado que considera incompetentes ou inaptos para o exercício do cargo e que terão sido indigitados por razões de militância no PS», refere a terminar o secretário de Estado dos Assuntos Fiscais.

Para pequena história fica no entanto a falta de rigor de Carlos Carvalhas e a sua defesa «a contrario sensu» dos «boys» e «girls» laranja. 

PEDRO BACELAR

Nuno Baltazar Mendes

Falar de Pedro Bacelar e dos seus procedimentos enquanto governador civil de Braga é hoje algo de inevitável e porque não dizer, politicamente correcto, não é esse, contudo, o objectivo deste modesto artigo.

A reflexão que pretendo fazer tem que ver com algo diferente.

O procedimento de Pedro Bacelar traduziu-se num simples acto de compreensão e de respeito com uma determinada família cigana face às circunstâncias de momento. Não obstante tal simplicidade, é manifesto que a sua conduta teve um significado mais profundo e de consequências mais sérias.

Estou sinceramente convencido que sim. Antes de mais porque o governador civil de Braga agiu em relação à situação concreta, com imparcialidade e isenção tendo entendido que o que estava em causa naquele caso concreto não podia deixar de ser tratado com a mesma tolerância, justiça e isenção, tendo em atenção os princípios e valores que regulam o Estado de Direito Democrático.

Pedro Bacelar não hesitou perante as eventuais consequências negativas de uma eventual opinião pública negativa e até hostil, o que é revelador da seriedade e dignidade do seu procedimento.

A coragem de dizer Não ao consenso fácil e inócuo; o «atrevimento» de ir contra a corrente; o agir com a liberdade própria dos independentes de espírito impressionaram-me fortemente. As convicções daquele homem simples, tranquilo e dedicado, evidenciaram afinal um homem dedicado e absolutamente determinado.

Não foi Pedro Bacelar que pôs em causa a segurança e a tranquilidade das populações. A intolerância, a insensatez, a reacção fácil e emotiva são não raras vezes as responsáveis pelo agravamento das próprias situações que «visam» resolver.

Muitas vezes é necessário olhar mais longe para trás, para conseguir ver mais para a frente.