MULHERES PELO DIREITO AO ABORTO
Um grupo de mulheres fez, durante a noite passada, uma vigília frente à Assembleia da República com o objectivo de apelar à constituição de um Movimento de Mulheres pelo Direito ao Aborto e fazer chegar ao País a ideia de que «legalizar o aborto é abandonar lógicas autoritárias de imposição de políticas criminais».
Este grupo de mulheres argumentou que «o "direito à vida" é um direito com sujeito. No caso do aborto, o sujeito do direito é a mulher».
O grupo de mulheres lembrou que a vida não se resume à mera sobrevivência, sem qualquer dignidade de condição humana e sublinhou, por isso mesmo, a importância de atender às condições em que um ser humano nasce, salvaguardando o direito fundamental de que a Mulher é titular, a liberdade de optar, com «consciência» e «responsabilidade pessoal».
As mulheres reivindicaram a reposição da Justiça, fazendo referência à discussão que será realizada hoje, em plenário parlamentar, sobre os projectos de lei que visam a discriminalização do aborto.
Na opinião destas cidadãs, trata-se de «um direito das mulheres que vai ser decidido por uma maioria de homens...», pelo que não pouparam palavras quando clamaram:
«Basta de hipocrisia e de políticas de avestruz!».
(Maria João Rodrigues)
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ALTERAÇÃO À LEI DO ABORTO
«DIGA NÃO À HIPOCRISIA»
A Juventude Socialista editou, recentemente, um desdobrável que aborda o tema do aborto em que as palavras de ordem são o «não à hipocrisia» e «diga sim à alteração à lei do aborto».
Na brochura, os jovens socialistas argumentam que «a aprovação do projecto da JS na Assembleia da República não provocará qualquer aumento do número de interrupções voluntárias realizadas em Portugal, mas diminuirá a tragédia do aborto clandestino» e defendem que a oposição a esta proposta, bem como a manutenção da presente situação não evitarão um aborto porque «a defesa da actual lei não serve a vida: serve a hipocrisia».
No seu interior, o desdobrável informa que a JS apresentou à Assembleia da República um projecto de lei que visa alterar a legislação em vigor sobre a interrupção voluntária da gravidez (IVG), sublinhando os dois aspectos do diploma considerados fundamentais.
O projecto de lei da Juventude Socialista, «por um lado, altera o prazo dentro do qual é permitido o aborto eugénico (aquele que resulta da existência de malformações no feto), de 16 para 24 semanas. Por outro lado, consagra a possibilidade de a IVG se realizar a pedido da mulher, nas primeiras 12 semanas de gravidez, para salvaguarda da sua integridade moral, dignidade social e ou maternidade consciente», explica a brochura.
O desdobrável responde ainda a algumas das perguntas que podem ser formuladas em torno desta polémica, como o porquê da alteração dos prazos do aborto eugénico, bem como da actual legislação, no sentido de ser permitida a IVG nas primeiras 12 semanas de gravidez a pedido da mulher.
«A realização do diagnóstico pré-natal, de acordo com as técnicas mais recentes e seguras, não permite a obtenção de resultados quanto à saúde do feto dentro do prazo legal», é a resposta dada à primeira pergunta.
«A proibição e criminalização do aborto, não só são ineficazes para o combater, como provocam um grave problema de saúde pública que é o aborto clandestino» é a resposta para a segunda pergunta, acrescentando-se o facto de que desde 1984 (ano de entrada em vigor da actual legislação) foram 300 mil os casos de IVG ilegais em Portugal.
Para concluir, a brochura da JS sublinha que «a actual legislação passa ao lado da realidade e provoca discriminação económico-social».
(Maria João Rodrigues)
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CONTRA A HIPOCRISIA
A PROPÓSITO DA LEI DO ABORTO
Quando este texto for publicado no AS provavelmente estar-se-á a discutir e a votar no mesmo dia, em Plenário da AR, a lei (ou leis) respeitantes à Interrupção Voluntária da Gravidez, vulgo lei do Aborto.
Por acreditar que se trata das tais questões sobre as quais temos o dever moral de nos pronunciarmos, ainda por cima políticos com responsabilidades de intervenção no meio social, entendi, de modo sucinto, dizer o que penso sobre esta questão.
Quero à partida esclarecer que respeito integralmente todas as diferentes (das minhas) convicções sobre este assunto no pressuposto que as mesmas são eivadas de honestidade intelectual e motivadas por fortes convicções. Não quero discutir onde começa o conceito de vida a partir da gestação. É um terreno onde nem na comunidade científica há consenso, mas é o único argumento válido que aceito para se justificar uma opção contra o direito de abortar por razões sociais, desde que assumido com total honestidade intelectual e respeito pelas opiniões contrárias. Desprezo totalmente todas as manifestações de pura hipocrisia política que sobre este tema vão passando, nomeadamente aquelas que em nome de valores sagrados, como a vida, vêm de pessoas ou agentes para quem o valor da vida tem duas faces, como por exemplo ignorarem as causas directas e indirectas de morte que o aborto clandestino provoca, ou de usarem o valor da vida para combater o aborto e esquecerem-se do mesmo valor quando se tenta por exemplo justificar a pena de morte. Mas, sem me adiantar mais na argumentação, esclareço desde já que subscrevi o projecto da JS e votarei também o projecto do Strecht Monteiro.
As razões que me levam a esta atitude são:
Aqui, de facto, trata-se de uma questão essencialmente política.
São estas as razões básicas que me levaram a subscrever o projecto da JS mas, já agora, aduzo algumas considerações que para mim são determinantes e que têm muito mais a ver com a hipocrisia dos homens do que com a sua consciência. Em primeiro lugar o Planeamento Familiar. Os militantes mais subtis da causa contra o aborto clamam agora pelo Planeamento Familiar. Ainda bem, mais vale tarde do que nunca. Mas que não ignorem o facto de o Estado nunca ter promovido seriamente uma eficaz campanha de esclarecimento em favor das vantagens do Planeamento Familiar e o facto da Igreja Católica ter sido (e ainda o é) o pior inimigo do Planeamento Familiar. Já foi despenalizado religiosamente o uso do preservativo e da pílula?
Todos somos pelo direito à vida! Dos que já estão vivos e dos que vão nascer. A uma vida digna, mais justa e solidária e com menos exclusão social. Há também aqui uma grande hipocrisia. Quem verdadeiramente defenda o direito à vida, não pode desejar nascimentos de crianças sem viabilidade por malformação, algumas como é referido sem cérebro ou sem órgãos vitais. Quem verdadeiramente defende o direito à vida não pode desejar crianças sem viabilidade económica de subsistência, obrigadas a prostituírem-se nos terminais do metro, a vasculhar no lixo o alimento e a drogarem-se com cola pelos cantos da cidade. Não teria sido melhor promover o Planeamento Familiar? O que se fez para recuperar estas crianças? Mais escolas, mais centros de acolhimento? Onde estão as consciências pela defesa prática dos direitos destas crianças. Pelo seu direito à vida sem discriminações? Pelo seu direito ao afecto?
Combater o aborto é combater as causas que lhe dão origem. É combater a exclusão social, a ignorância, é lutar pelo direito à habitação, à saúde, à educação e à informação.
Se queremos evitar, ou acabar com o aborto porque não pugnarmos pela introdução de uma cadeira de Educação Sexual nas escolas, a partir do ensino básico. Assim, estaríamos efectivamente a contribuir para erradicar, tanto quanto possível, a necessidade do recurso ao aborto por razões sociais, económicas e até morais.
Por mim, mesmo que no nosso país, apenas uma única mulher necessitasse de praticar o aborto, continuaria a defender o direito de a mesma o poder efectuar em condições de segurança e dignidade da pessoa humana e sem correr o risco de penalização criminal.
(Miguel Coelho)
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DESPENALIZAÇÃO DO ABORTO
TITO DE MORAIS ESCREVE AOS DEPUTADOS SOCIALISTAS
O presidente honorário do PS, Manuel Tito de Morais, dirigiu no dia 17 uma carta ao Grupo Parlamentar do PS, na qual define de uma forma muito clara a sua posição sobre a questão da despenalização do aborto, considerando estarmos perante um problema «essencialmente político» e lembrando que «nenhuma mulher aborta por prazer».
«Sei que ao dirigir-vos esta mensagem estou sendo arrastado pela ardilosa campanha que se desenvolve a propósito dos projectos de "Despenalização do aborto", mas também sei que o facto de ser vosso Presidente Honorário, acrescido de fundador do Partido com o número três, me obriga nesta ocasião a definir a minha posição sobre a matéria, razão que prevalece», lê-se na missiva enviada por Manuel Tito de Morais aos seus camaradas deputados da bancada socialista.
Segundo o fundador do PS, «o que está sendo posto em causa é um problema essencialmente político, e não é matéria de natureza íntima ou de consciência pessoal», acrescentando que «também se não trata dum assunto sobre o qual todos os deputados do Partido se não devam pronunciar».
«É um problema», sublinha, «sobre o qual é necessário legislar como o é, por exemplo, o problema da droga, com o objectivo de reduzir, não sendo possível anular, os efeitos nocivos da sua prática.»
«Nenhuma mulher aborta por prazer», refere Manuel Tito de Morais, sublinhando que «quando a isso é constrangida fá-lo por múltiplas, poderosas e compreensíveis razões e recorre ao aborto clandestino porque a legislação lhe impede a prática legal. Fazendo-o, arrisca a própria vida».
Neste contexto, o presidente honorário dos socialistas considera que «há o dever de diminuir ao máximo este risco e assim o entenderam os jovens socialistas com a apresentação do seu projecto».
Para Manuel Tito de Morais, «o que está em causa é a vida da mulher, é essa que é preciso salvaguardar, sem nos deixarmos iludir com a subtileza de alguns argumentos que procuram baralhar as ideias».
«Confio nos deputados socialistas», refere no final da sua missiva.
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Carta de Maria Emília Tito de Morais
Também a militante histórica do PS Maria Emília Tito de Morais dirigiu uma carta no dia 23 de Dezembro de 1996 ao Grupo Parlamentar do PS sobre a discussão então iniciada na Assembleia sobre o aborto.
Na carta, Maria Emília Tito de Morais começa por lembrar aos deputados socialistas que «em 25 de Janeiro de 1984 se iniciou na Assembleia da República o debate de seis projectos de lei sobre a interrupção voluntária da gravidez (um do PS). A votação teve lugar no dia 27 e foi aprovado o projecto do PS sobre despenalização do aborto».
Salientando não existir «razão nenhuma para que não esteja em vigor» o diploma do PS então aprovado, Maria Emília Tito de Morais pergunta: «Porquê 12 anos depois voltar a discutir o mesmo?».
Para a militante do PS, «fazer ou não um aborto é coisa do foro íntimo». Por isso, diz não entender o que tem a Assembleia da República - composta de homens em grande maioria - a ver com isso neste momento».
Num «post scriptum» Maria Emília Tito de Morais reafirma o seu apoio total à proposta da JS, que felicita pela iniciativa.
(J. C. Castelo Branco)