SEGURANÇA SOCIAL

 

Solidariedade e Segurança Social

PARA ALÉM DO ASSISTENCIALISMO

A proposta de lei de bases gerais do sistema de solidariedade e de segurança social foi aprovada, na reunião do Conselho de Ministros realizada no passado dia 17.

Esta proposta de lei, a submeter à apreciação da Assembleia da República, consagra os dois objectivos estratégicos da reforma que o Governo propõe, isto é, reforçar a eficácia do modelo de protecção social e garantir as bases da sustentabilidade financeira do sistema de segurança social.

Esta proposta consagra também o princípio do primado da responsabilidade pública, nos termos do qual cabe ao Estado assegurar a criação de condições à efectivação do direito de todos os cidadãos à protecção social.

O sistema da solidariedade e da segurança social surge agora concretizado através de três grandes ramos de protecção: a protecção social de cidadania; a protecção à família e a protecção social substitutiva dos rendimentos da actividade profissional.

A importância sistemática e de fundo que é dada ao ramo protecção social de cidadania decorre da necessidade de evidenciar o direito à segurança social como um direito do cidadão e de garantia dos mínimos vitais.

O princípio da universalidade, consagrado na Constituição da República Portuguesa, surge assim concretizado na sua verdadeira dimensão.

Neste ramo, surgem, pela primeira vez, dois regimes que se destinam a proteger os respectivos beneficiários em função das eventualidades previamente indicadas.

Em primeiro lugar, o regime da solidariedade, ao abrigo do qual são concedidas as prestações pecuniárias de rendimento mínimo garantido, pensões sociais e os complementos sociais, sempre que as prestações substitutivas de rendimentos da actividade profissional se mostrem inferiores a determinados valores mínimos legalmente estabelecidos.

Prevê-se, também, a instituição de um complemento social, variável em função da carreira contributiva e da idade dos pensionistas, sendo que a sua aplicação dependerá das necessidades de equilíbrio financeiro das contas públicas.

Pela primeira vez, a acção social, à qual se faz expressamente corresponder também um conjunto de eventualidades, surge integrada no seio do sistema da solidariedade e da segurança social, conferindo-lhe uma outra dignidade e importância, que vai muito além da lógica assistencialista a que, tradicionalmente, tem estado subordinada.

É inovadora também a instituição do regime de protecção à família que visa garantir o direito à cobertura, designadamente, nas eventualidades encargos familiares, deficiência e dependência. Esta última é também uma importante novidade e reflecte a preocupação de dar resposta ao surgimento de novos riscos sociais que a legislação anterior não contemplava.

Em sede da protecção social substitutiva dos rendimentos da actividade profissional - claramente estes e não apenas os do rendimento do trabalho - o objectivo essencial é o de assegurar também aqui a equidade e justiça social, através do reforço de medidas redistributivas e tendentes ao aumento da solidariedade interprofissional e intergeracional.

Destas medidas é de destacar a possibilidade, agora aberta, de o quadro legal das pensões pode ser caracterizado pela flexibilização da idade de reforma - medida essencial à promoção do emprego -, o alargamento do período relevante para a determinação do respectivo valor e ainda a diferenciação positiva das taxas de substituição, a favor dos beneficiários com mais baixos rendimentos.

É de salientar ainda, como medida essencial à promoção do emprego e com o intuito de desonerar o factor de produção trabalho relativamente a outros, a possibilidade de o valor das contribuições a pagar pelas entidades empregadoras ser apurado em função de bases de incidência distintas das remunerações.

Acresce igualmente que as taxas contributivas poderão também variar em razão das entidades contribuintes, das actividades económicas em causa, das situações específicas dos beneficiários ou de políticas conjunturais de emprego.

Está prevista também, agora, a possibilidade de ser introduzido um limite de incidência contributiva, com respeito pelos direitos adquiridos e em formação e pelo princípio da solidariedade.

Em sede do financiamento são de destacar, como novidades, a introdução dos princípios da diversificação das fontes de financiamento e da adequação selectiva. Em obediência ao primeiro, e tendo em vista designadamente a redução dos custos não salariais da mão-de-obra e o reforço da equidade no sistema da segurança social, fica prevista a criação de uma contribuição de solidariedade.

Foi preocupação fazer corresponder a cada ramo de protecção não apenas as eventualidades a que se destinam, mas também as formas respectivas de financiamento.

 

Governo apresenta reforma para a Segurança Social

PENSÕES SOCIAIS MAIS DEGRADADAS TERÃO ACTUALIZAÇÃO GRADUAL

O ministro do Trabalho e da Solidariedade apresentou quinta-feira, na Assembleia da República, os grandes princípios da proposta do Governo de Lei de Bases de Segurança Social -- uma área delicada da sociedade e em relação à qual os socialistas continuam a encarar como merecedora de um pacto entre gerações. Por esta razão, precisamente, o primeiro-ministro tem insistido que a reforma do sistema deverá contar com um amplo consenso político no País. Para as pensões mais degradadas, Ferro Rodrigues assegurou que o Executivo irá prosseguir uma política de actualização e de correcção das injustiças, mas de forma gradual e não demagógica. Aproveitou para criticar a proposta irrealista do PP, que, se fosse aprovada, até 2005, representaria um acréscimo de custos para o Estado na ordem dos 1552 milhões de contos, correspondendo a 1,7 por cento do Produto Interno Bruto.

«A Lei de Bases de Segurança Social irá dar passos no sentido de corrigir e reactualizar as pensões de mais baixo valor, mas, com toda a clareza, afirmo que não iremos alinhar num processo de promessas de efeito fácil, onde escasseiam a responsabilidade e as preocupações com a justiça social», afirmou Ferro Rodrigues já no final do seu discurso, referindo-se indirectamente ao teor do projecto de lei do partido de Paulo Portas para o aumento das reformas.

Se fosse aprovado o projecto do PP, segundo o ministro do Trabalho e da Solidariedade, o Estado teria «um acréscimo de custos que, até 2005, somaria 1552 milhões de contos e, só nesse ano, corresponderia a cerca de 1,7 por cento do PIB». Explicou, então, que esses 1552 milhões de contos «correspondem a 55 milhões de contos no primeiro ano que entrasse em vigor, a 110 milhões no segundo, 166 no terceiro, até 388 milhões no último, sendo pois errada tecnicamente a comparação com o Rendimento Mínimo Garantido», esclareceu. Demonstrando a demagogia dos partidos da oposição e, sobretudo dos populares, Ferro Rodrigues ainda acrescentou que, «se levarmos em conta outra proposta despesista do PP quanto à Lei de Finanças Locais (796 milhões de contos até 2005), o impacto orçamental global atingiria 2348 milhões de contos e, só em 2005, seria equivalente a 2,2 por cento do PIB».

Tal, em conclusão, representaria «um custo elevado e não são sérias as respostas encontradas para o seu financiamento». Simplesmente, «porque este será um custo adicional que o crescimento económico por si não compensará e que a sugestão da afectação de outras receitas fiscais não resolverá. A menos que o PP queira a estagnação das prestações familiares, dos apoios para a acção social às IPSS e defenda o congelamento real dos ordenados na Função Pública durante sete anos, o não desenvolvimento do pré-escolar ou uma brutal desaceleração do investimento público», denunciou o ministro do Trabalho e da Solidariedade.

 

A proposta do Governo

Bem diferente foi o processo seguido pelo Executivo para a elaboração da sua proposta de lei para reformular o sistema de Segurança Social. Um processo que, de acordo com Ferro Rodrigues, passou por uma reflexão alargada e plural na sociedade portuguesa, pela introdução de importantes reformas na nossa protecção social como o Rendimento Mínimo Garantido, ou a diferenciação positiva das prestações familiares e das actualizações de pensões, e por uma gestão rigorosa no combate à fraude e evasão. Rigor, ainda, no «cumprimento das responsabilidades financeiras do Estado para com a protecção social». Trata-se, por esta razão, de uma lei «inovadora e ambiciosa, que pretende dar corpo a um novo e mais exigente patamar de protecção social no País».

Segundo o ministro do Trabalho e da Solidariedade, a proposta de lei de Bases da Segurança Social apresenta três objectivos: promover a melhoria das condições e dos níveis de protecção social e o reforço da respectiva equidade; melhorar a eficácia do sistema e a eficiência da sua gestão; e assegurar a sustentabilidade financeira do sistema como garantia da adequação do esforço exigido aos cidadãos ao nível de desenvolvimento económico e social alcançado».

Na perspectiva do mesmo membro do Executivo, o diploma aprovado quinta-feira passada, em Conselho de Ministros, tem metas que «correspondem a um diagnóstico profundo do que hoje existe em Portugal sobre o sistema». A proposta de lei de Bases da Segurança Social, ainda na opinião do titular da pasta do Trabalho e da Solidariedade, irá consagrar os princípios da igualdade, da universalidade, da diferenciação positiva, da solidariedade, do primado da responsabilidade pública, da complementaridade e da informação.

«Com a introdução dos direitos sociais de cidadania, o edifício da protecção social em Portugal dá um poderoso passo no sentido da construção de uma sociedade mais solidária, passo aliás consistente com o facto de Portugal ser um dos poucos países do mundo onde o direito à Segurança Social tem dignidade constitucional», lembrou o dirigente nacional socialista.

Com a aprovação do diploma do Executivo, acrescentou ainda Ferro Rodrigues, tornar-se-á possível «garantir a flexibilização da idade legal da reforma para efeitos da atribuição de pensões, alargar progressivamente o período relevante para o cálculo da formação da pensão tendo em atenção a carreira contributiva de cada beneficiário, e introduzir uma diferenciação positiva das taxas de substituição, a favor dos beneficiários com mais baixos rendimentos».

 

Jorge Coelho desafia

Durante a interpelação do PP ao Governo, o ministro da Administração Interna usou da palavra a encerrar o debate, mas para denunciar a estratégia negativa da oposição e, em especial do PSD. Jorge Coelho desafiou então o PP, o PCP e o PSD a apresentarem interpelações sobre as consequências da introdução do Rendimento Mínimo Garantido em Portugal, sobre os aumentos das prestações familiares, das pensões e dos salários (sempre superiores à inflação), sobre a adesão de Portugal ao «euro», ou no que respeita à descida dos índices de criminalidade no País e, em particular, nas áreas metropolitanas de Lisboa e do Porto.

Lembrando algumas das principais medidas já tomadas pela equipa de António Guterres, o ministro Adjunto e da Administração Interna não hesitou em concluir que «o País está hoje melhor do que em 1995. Esse é o grande desgosto do PSD, cuja preocupação política é dizer mal do Governo».

Ainda na lógica de ataque ao partido de Marcelo Rebelo de Sousa, Jorge Coelho denunciou o facto de, até hoje, o PSD «nunca ter tomado uma medida que beneficiasse um único português». Depois, com ironia, elogiou as qualidades intelectuais de Pacheco Pereira, deputado do PSD que usara da palavra momentos antes, mas que tem estado afastado da linha da frente pela actual direcção «laranja». Por isso, Jorge Coelho observou que Pacheco Pereira é uma solução de recurso «sempre que o PSD está com problemas graves. Pacheco Pereira, para o PSD, funciona como um autêntico «viagra» para resolver esses problemas», disse, motivando uma prolongada gargalhada entre os deputados.