POLÍTICA



 

Indonésia - Pós-Suharto

GUTERRES APELA PARA LIBERTAÇÃO DE XANANA GUSMÃO

Suharto não resistiu à contestação popular. Mas o novo homem forte de Jacarta, Habibie, é um delfim do antigo ditador. Face a esta nova realidade pós-Suharto marcada por uma certa evolução na continuidade, os democratas indonésios e a comunidade internacional pressionam o novo poder em Jacarta. É, pois, neste contexto, que o Governo português tem feito uma ofensiva diplomática em várias frentes no sentido da libertação de Xanana Gusmão e de uma solução política para Timor-Leste que garanta a autodeterminação deste território.

O primeiro-ministro, António Guterres, disse no dia 26 que o Governo lançou uma intensa acção diplomática com vista a conseguir que na sequência dos acontecimentos na Indonésia venha a ser conseguida a libertação de Xanana Gusmão e dos outros presos políticos.

No âmbito desta acção, o primeiro-ministro revelou que falou pessoalmente com o secretário-geral das Nações Unidas e com o actual presidente da União Europeia, Tony Blair, solicitando a intervenção pessoal dos dois, enquanto através do seu gabinete tinha contactos com os gabinetes do Presidente dos Estados Unidos e de todos os chefes de Governo da União Europeia.

Simultaneamente, acrescentou, e além da convocação para um debate deste tema no Conselho Europeu feita pelo ministro dos Negócios Estrangeiros no dia 25 no Conselho de Assuntos Gerais, em que se tiraram conclusões favoráveis aos direitos do povo timorense, o ministro dos Negócios Estrangeiros escreveu também à secretária de Estado norte-americana, Madelaine Albright, ao secretário-geral das Nações Unidas, Kofi Annan, e aos seus colegas da África do Sul e de diversos países asiáticos, reafirmando as exigências portuguesas para a libertação de Xanana Gusmão e a autodeterminação de Timor-Leste.

Portugal instou no dia 25 os parceiros europeus a apoiarem as forcas democráticas indonésia e a pressionarem Jacarta para que instaure melhores condições de vida política em Timor-Leste.

Foi deste modo que o ministro dos Negócios Estrangeiros português, Jaime Gama, justificou aos jornalistas o agendamento, a pedido de Portugal, da situação social e política na Indonésia para o Conselho de Assuntos Gerais da União Europeia, que decorreu em Bruxelas.

Jaime Gama sensibilizou os seus homólogos dos Quinze para a necessidade de apoiar firmemente aqueles que na Indonésia reclamam democracia e um Estado de Direito.

Por outro lado, o Governo português pretendeu cativar os outros países da União para a libertação de presos políticos, indonésios e timorenses.

No Conselho de Assuntos Gerais da União Europeia realizado no dia 25 foi aprovado um comunicado em que a União Europeia se compromete a apoiar reformas políticas e económicas na Indonésia, exortando Jacarta a viabilizar o envolvimento dos sectores democráticos do país no processo de que os Quinze fazem depender o futuro de Timor-Leste.

O compromisso consta de um comunicado do Conselho de Assuntos Gerais da União Europeia sobre a crise indonésia, no qual os ministros dos Negócios Estrangeiros dos Quinze instam o Governo de Jusuf Habibie a dar resposta positiva às «aspirações democráticas do povo indonésio».

Neste contexto, apela-se, no comunicado, para a participação activa dos partidos da oposição e das organizações não governamentais

da Indonésia nas reformas que a União deseja ver encetadas e reclama-se a realização de eleições «livres e justas».

Os Quinze congratulam-se, no documento, com a libertação de dois presos políticos indonésios, medida que desejam ver estendida a todos

os detidos nessas condições.

Os chefes da diplomacia dos Quinze esperam ainda de Jacarta «total respeito dos direitos humanos e das liberdades individuais» do povo indonésio, cujo direito de «continuar a exprimir-se livremente» incentivam.

Reconhecem a «particular importância da ajuda humanitária (europeia) a Timor-Leste», território onde a crise indonésia tem implicações.

No mesmo comunicado, o Conselho insta as autoridades indonésias a «participar construtivamente nos esforços, sob os auspícios do secretário-geral das Nações Unidas, para a obtenção de uma solução justa, global e internacionalmente aceite» para a questão timorense.

Às mesmas autoridades é também pedido um comportamento construtivo para com a «troika» comunitária (missão de embaixadores de três países da UE, no caso Holanda, Reino Unido e Áustria), que visitará o território sob administração portuguesa anexado pela Indonésia a 10 de Junho.

Os embaixadores europeus têm previstos encontros com representantes de entidades independentes e com os bispos das duas dioceses locais.

 

Timor-Leste: Xanana e outros presos políticos rejeitam amnistia

Comentando a declaração do Conselho sobre a crise indonésia, o chefe da diplomacia portuguesa salientou a existência de «uma maioria esmagadora» de ministros dos negócios estrangeiros da União com uma «perspectiva correcta da analise da situação (indonésia)», contexto em que os mesmos responsáveis inscrevem, acertadamente segundo Jaime Gama, a problemática de Timor-Leste. Não obstante, Jaime Gama deixou antever que a negociação da tomada de posição do Conselho sobre a situação na Indonésia foi trabalhosa, sobretudo para Portugal, cujas propostas «contribuíram para melhorar o comunicado». O ministro referia-se às alusões directas a Timor-Leste contidas no texto.

Questionado sobre o estado da ajuda humanitária da UE ao povo timorense, sobre a qual a Comissão Europeia se escusa sistematicamente a pronunciar invocando a necessidade de não ferir as sensibilidades indonésias, Jaime Gama assegurou que a instituição «está a cumprir aquilo para que foi mandatada» no quadro da posição comum assumida pelos Quinze, há cerca de dois anos.

Jaime Gama disse desconhecer as propostas do ministro da Justiça indonésio, segundo as quais Jacarta estaria a ponderar a revisão da sua política para Timor-Leste e a examinar a possibilidade de dar ao território o estatuto de Região Especial, dotada de maior autonomia. O ministro português destacou, no entanto, a existência de «um membro do novo Governo indonésio que, pela primeira vez, diz que a Indonésia deve rever a sua posição em relação a Timor-Leste».

 

Presos políticos

Entretanto, Xanana Gusmão e duas dezenas de outros presos políticos detidos em cadeias indonésias divulgaram no dia 25 uma declaração em que rejeitam ser libertados no âmbito de uma amnistia governamental, disse à Agência Lusa uma fonte timorense em Jacarta.

A declaração está assinada por 21 presos políticos, entre os quais se inclui também o timorense João Câmara, referiu um elemento da Federação das Associações de Estudantes de Timor-Leste na Indonésia (IMPETTU).

Organizações de direitos humanos estimam em mais de 180 os presos políticos que cumprem penas nas cadeias indonésias, encontrando-se outras 600 pessoas detidas ou a ser julgadas por crimes de natureza política.

Entretanto, Xanana Gusmão foi entrevistado no passado domingo por jornalistas estrangeiros na prisão de Cipinang.

O líder histórico da resistência timorense, que surgiu perante os jornalistas com um boné do Benfica na cabeça, disse que a luta pela independência de Timor-Leste prosseguirá, apesar da queda de Suharto.

O líder timorense, de 51 anos, rejeitou ser amnistiado pelo Governo de Jacarta, por considerar que isso implicaria um perdão por um crime que considera não ter cometido.

Xanana Gusmão liderava a guerrilha timorense quando foi detido em Díli em 1992 e cumpre uma pena de 20 anos de prisão na cadeia de Cipinang.

 

Ximenes Belo pede diálogo ao novo Governo

D. Ximenes Belo defende que o Governo indonésio dê o «primeiro passo» para a solução da questão de Timor-Leste através de «um dialogo construtivo com os timorenses» e da libertação dos presos políticos do território.

Em declarações ao jornal «La Vanguardia», o co-laureado com o Prémio Nobel da Paz de 1996 afirma que o novo presidente indonésio «deve procurar dialogar com os timorenses para encontrar uma solução justa, pacifica e honrada para os timorenses, uma solução sem vencedores nem vencidos».

 

Pressão diplomática do Governo

LIBERDADE PARA XANANA GUSMÃO

O Governo socialista está a desenvolver intensa actividade diplomática para que o regime ditatorial indonésio liberte finalmente Xanana Gusmão e outros presos timorenses. Terça-feira, no primeiro dia do Conselho de Ministros, realizado em Alcácer do Sal e que ontem terminou, António Guterres disse que o Presidente da República e o ministro dos Negócios Estrangeiros, juntamente com ele, vão tomar sucessivas iniciativas políticas para sensibilizar a comunidade internacional no sentido de pressionarem a Indonésia a abrir-se à democracia e aceitar uma solução justa e internacionalmente reconhecida para a autodeterminação de Timor-Leste.

Entre os contactos efectuados pelo primeiro-ministro, contam-se os de Tony Blair, chefe do Governo britânico e presidente da União Europeia, Kofi Annan, o secretário-geral das Nações Unidas, e Bill Clinton, presidente dos Estados Unidos da América.

Por seu turno, Jaime Gama enviou cartas à secretária de Estado norte-americana, Madelaine Albrigh e aos seus homólogos da África do Sul, Tailândia, Japão, Coreia do Sul, entre outros países. «Estes esforços devem ser acompanhados por todos os portugueses», salientou António Guterres.

No final do Conselho de Ministros, o secretário de Estado da Presidência revelou que o Governo fez uma reflexão sobre os aspectos já cumpridos pelo Executivo em relação ao programa que se propôs perante os portugueses e que foi aprovado na Assembleia da República.

Em termos de futuro, advertiu, no entanto, para a existência de um oposição meramente negativa, que impede que o Executivo tome medidas. Entre outros factos, Vitalino Canas lembrou que o Governo propôs pactos de regime às forças da oposição e que até agora não teve qualquer resposta.