LIBERDADE DE EXPRESSÃO 



A BATALHA DE OURIQUE

CARLOS ZORRINHO

Em Julho de 1139, reza a tradição histórica que os portugueses comandados pelos grande Afonso Henriques bateram o sarraceno liderado por Esmar, no lugar de Ourique, abrindo caminho à fundação da nacionalidade. Mais de oito séculos passados as terras de Ourique viram-se submetidas a um novo e terrível inimigo, de rosto difuso e humor variável, e que os especialistas chamam «El Niño».

Sinal dos tempos, deste combate não foi contudo um novo Henriques quem emergiu. Pelo contrário, as pantalhas inundaram-se da figura sinistra dum anti-herói, autarca da terra, que sob o húmus ainda quente do morticínio, não hesitou em pelejar na caça ao voto para as autárquicas que se avizinham e na conquista duma notoriedade útil para as convulsões que alguns adivinham no seu partido para o período pós-eleitoral.

De caminho quebrou-se uma regra de conduta que deveria ser sagrada em cenário de catástrofe, ou seja, violou-se o princípio de que enquanto se auxiliam as vítimas não se repartem as culpas. E, sobretudo, distorceu-se perante o País a imagem serena, convicta mas humilde, reservada mas sábia, do povo alentejano.

Um povo que em tempos saberá julgar no coração e nos votos, as boas e as más acções dos que acorrem ao terreiro da batalha ou dos que dela se omitiram.

Entre os perfis humanos imortalizados na sombra dos combates, sempre se destacou como a figura do caça-despojos. Dele se dizia que era sempre o primeiro a chegar ao campo de batalha, depois de a batalha terminar! A sua especialidade era recolher os haveres ainda agarrados à carne fresca dos mortos ou dos feridos indefesos. Só depois, quando o fragor da guerra permitia, chegavam os coveiros e os curas, para enterrar os mortos e tratar os enfermos.

Em Ourique, no dealbar do milénio, a coreografia repetiu-se, com nova estilização, directos televisivos, mas as mesmas marcações e as mesmas grandezas e misérias da natureza humana.

Conscientes disso, é chegado o tempo de serenamente prestarmos homenagem à dignidade do povo de Alentejo e aprender com os erros cometidos para agir melhor em futuras situações de catástrofe, ocorram onde ocorrerem e quando ocorrerem, no território nacional.

Tal como o sarraceno de antanho, «El Niño» por agora recuou, mas nada nos garante que não se esteja a reorganizar para novas e fulgurantes investidas Desejo profundamente que o monstro climático se refugie num sono profundo. Mas se voltar, que nos encontre a todos mais despertos, preparados e solidários.

Espero sinceramente que os heróis dessas batalhas, se elas vierem a ocorrer, sejam os intrépidos bombeiros, os ágeis coordenadores da protecção civil, os eficazes hospitais e os eficientes responsáveis do apoio social, e não um qualquer aspirante a primeira figura, construindo-se sobre escombros da tragédia alheia.

A Batalha de Ourique foi um momento crucial na formação da nossa identidade enquanto nação. A nova batalha que agora se desenrolou sob os nossos olhos, poderá marcar um tempo de viragem para uma nova atitude e uma nova eficácia no enfrentamento dos momentos difíceis e das catástrofes naturais a que o território sempre se sujeita.

E já agora, uma generalização ousada mas sentida. Que marque também o inicio de um novo tempo para o Alentejo, feito de trabalho e investimento, de projectos e empenhos, de debates e consensos, e não apenas de palavras.

Que o Alentejo seja um paraíso ecológico, mas não apenas um santuário para as aves de rapina.




PORTUGAL, A AGENDA 2000, O ALARGAMENTO, A COESÃO E A NOVA CENTRALIDADE EUROPEIA

JOEL HASSE FERREIRA

Têm estado em cima da mesa parlamentar nacional algumas questões com forte impacto no domínio político, económico e social, para além das que abordam questões de carácter social, educacional, institucional ou concernentes ao ordenamento do território.

Entretanto, em termos europeus, algumas outras questões ganham vulto à medida que avança a discussão institucional e pública da Agenda 2000.

De que forma, podemos equacionar com algum rigor as questões económicas centrais ligadas à Agenda 2000 ?

Emerge, neste contexto, um problema de difícil resolução, consubstanciado numa restrição essencial. Encontra-se estabelecido, no quadro da União Europeia, o limite de 1,27% do Produto Interno Bruto da União como tecto do Orçamento da União Europeia.

Entretanto, afigura-se como fundamental entender que, do ponto de vista geográfico, perdendo Portugal a centralidade, não a perde do ponto de vista económico e monetário. A concretização da 3ª fase da União Económica e Monetária, envolvendo a criação do EURO, como moeda única adoptada desde já, provavelmente por onze países (Alemanha, França, Espanha, Portugal, Bélgica, Holanda, Luxemburgo, Irlanda, Finlândia, Áustria e eventualmente Itália ), recoloca Portugal do ponto de vista financeiro, no núcleo central da União. O EURO, como moeda de referência das transacções internacionais e como moeda de reserva de numerosos bancos centrais, ganhará um peso face ao dólar e ao YEN de que actualmente nenhuma moeda europeia disfruta.

Por outro lado, embora se mantenham em funcionamento e até se reforcem e aprofundem as diferentes instâncias de decisão da União Europeia, não subsistem dúvidas de que a participação num espaço de moeda única europeia ajudará a reforçar o envolvimento e a participação nas decisões tomadas em tempo real no quadro dos países que integrem à partida o espaço monetário do EURO.

O processo de alargamento da União Europeia, envolvendo onze novos candidatos à União (Hungria, Polónia, República Checa, Estónia, Eslovénia e Chipre bem como Letónia, Lituânia, Roménia, Bulgária e Eslováquia), durará alguns anos, implicará a análise evolutiva dos acordos de cooperação celebrados oportunamente e parlamentarmente ratificados entre cada um desses países, a União Europeia e os seus diferentes Estados membros.

A aplicação dos mecanismos e políticas de solidariedade da União Europeia, na sua actual estrutura e regulamentação, implicaria a impossibilidade de assegurar o limite acima referido como tecto orçamental da União. Só a aplicação, por exemplo, da Política Agrícola Comum à Polónia implicaria custos praticamente incomportáveis.

Então será necessário ou reformular os critérios das políticas estruturais e os regulamentos dos Fundos ou alargar o tecto orçamental de 1,27% do PIB da União, querendo compatibilizar o alargamento progressivo com a manutenção da solidariedade europeia para com os actuais e futuros países da União que necessitem de apoios a bem da coesão.

Neste contexto, interessa tornar claro que o interesse português passa por:

- reforçar o empenhamento na participação de Portugal no EURO desde o início.

- defender a ultrapassagem dos míticos 1,27% do PIB da UE como tecto limite para o Orçamento da União.

- propôr, com seriedade, que a reformulação da PAC deixe de privilegiar as agriculturas centrais-europeias face às produções mediterrânicas.

- defender que as alterações dos Fundos Estruturais não prejudiquem o desenvolvimento dos países mais carenciados da Europa do Sul.

- evidenciar a necessidade de coordenar políticas macro-económicas com alguma eficácia e avançar no sentido da harmonização dos regimes fiscais.

É necessário que junto da opinião pública portuguesa vão sendo discutidos estes pontos de vista. É necessário compatibilizar o alargamento com o aprofundamento da União Europeia, reformular as políticas estruturais reforçando a solidariedade, avançar na União Monetária e coordenar de forma mais eficaz a economia. É imperioso reforçar a unidade política e a coesão social na União Europeia.




GOVERNAR À ESQUERDA

JOAQUIM PINA MOURA (*)

A questão que se coloca a quem quer «governar à esquerda» não é - conforme uma citação célebre - «explicar a globalização mas como transformá-la» num sentido favorável às causas da liberdade, da solidariedade, da justiça social e da paz. Para isso é essencial, por um lado, qualificar e, por outro lado, regular a globalização que temos. Qualificar a globalização que temos é essencial, para não nos equivocarmos quanto às características, à dimensão do fenómeno no mundo contemporâneo. É preciso ter consciência que a globalização é um fenómeno complexo e diversificado, desigualmente difundido, quer nas diferentes esferas da vida social quer geograficamente.

«Governar à esquerda» implica defrontar o «poder mediático», com as suas responsabilidades sociais. Não é apenas o «poder mediático» que pode condicionar a política. A política - com a legitimidade e a representatividade únicas que lhe advêm da soberania do povo - tem de regular o «poder mediático».

Por exemplo, a respeito da difusão de imagens de violência, nas suas variadas manifestações, ou de salvaguarda das línguas nacionais, são não só defensáveis como desejáveis iniciativas políticas que regulamentem, imponham regras e condicionem a capacidade de os media poderem perverter ou tentar impedir a concretização das opções políticas manifestadas pelo voto dos cidadãos.

Qualificar a globalização que temos é, também, ter uma ideia objectiva da dimensão e dispersão geográfica da globalização económica. Por muito surpreendente que possa parecer, a globalização económica está muito aquém da globalização comunicacional. Segundo dados e análise trazida a público por Vítor Constâncio (in X Conferência Anual do «Semanário Econónico», 17-4-1997), «(...) Os Estados Unidos, o Japão e a União Europeia no seu conjunto só importam do exterior nove a dez por cento do seu produto nacional (...), em que 90 por cento da produção e dos consumos dependem do que se passa no seus próprios territórios». Por outro lado, «(...) a importância do comércio internacional para os principais países do mundo iguala hoje os níveis de 1913», sendo que «(...) o comércio internacional está concentrado dentro e entre os países desenvolvidos (80 por cento em 1970 e 85 por cento actualmente)».

E, mesmo quanto ao outro lugar - comum da ideologia conservadora sobre «a deslocalização das produções e da empresas para os países de mais baixos salários», defendendo, por isso, uma estratégia de nivelamento por baixo dos direitos salariais e sociais, nomeadamente na União Europeia, a realidade é também diferente.

Não obstante todo o furor do free-trade dominante na Organização Mundial de Comércio, e citando de novo o trabalho de Vítor Constâncio, «(...) dois terços do investimento directo estrangeiro que se realiza no mundo são feitos nos Estados Unidos e na Europa, sendo 45 por cento só nos Estados Unidos (...) ». Isto significa que, «(...) apesar de haver 1 500 milhões de pessoas no mundo que têm salários medios de dois dólares horários (enquanto nos países desenvolvidos são de 18 ou 20), não há uma transferência e uma deslocalização brutal da produção (...), que é feita e consumida, essencialmente, no plano interno da União Europeia, dos Estados Unidos e do Japão».

E, mesmo quanto às meninas-dos-olhos dos ideólogos conservadores e de direita - a liberdade de circulação de capitais e a crescente integração e globalização dos mercados financeiros -, é necessário especificar e fazer uma análise fina dos movimentos de capitais.

O que daqui deduzo é que para «governar à esquerda» é necessário dar firme combate às teses de direita e conservadoras que fazem da globalização uma ideologia a favor do nivelamento por baixo dos direitos económicos, salariais e sociais dos cidadãos; da justificação da inevitabilidade da exclusão social e da pobreza; da desestruturação dos mecanismos políticos que podem combater e regular os fenómenos perversos do chamado livre comércio», de destruição do papel insubstituível dos poderes públicos na garantia dos serviços de educação, saúde e segurança social para todos os cidadãos. Combater a «ideologia da globalização» implica, também, definir alternativas, contrapor à injustiça social globalizada defendida pela direita conservadora combate global da esquerda socialista por uma autêntica regulação da vida económica internacional, passando, nomeadamente, das práticas do «livre comércio» aos instrumentos do «comércio justo» .

Dando dimensão política e social aos mecanismos de integração económica e financeira, de âmbito regional que se vão afirmando em várias regiões do mundo (de que a União Europeia é o exemplo mais bem sucedido e desenvolvido).

No domínio da integração regional e sub-regional, esta é uma diferença radical entre as visões de esquerda e conservadora.

Esta, ao contrário daquela, tem da integração uma visão de comércio livre, de integração monetária e financeira, sem mecanismos de integração política como existem, por exemplo, na União Europeia.

Para «governar à esquerda», não se pode abdicar desta perspectiva. Maior integração económica e financeira supranacional exige maior integração e cooperação política e social supranacionais. Integração económica com regulação política tem de ser a regra.

É preciso calibrar o «livre comércio» com garantias de que será um «comércio justo».

Para isso é fundamental uma cláusula social na Organização Mundial do Comércio (OMC), para criar e garantir uma «carta de direitos humanos e sociais» nas trocas internacionais.

Não se pode aceitar e permitir uma concorrência internacional desigual de produtos e produções, baseados na exploração do trabalho infantil e de trabalhos forçados ou na ausência de direitos sociais, salariais e do direito à greve. São conquistas da civilização europeia, dinamizadas pelas forças de esquerda ao longo do século XX, de que não queremos nem devemos abdicar.

É preciso agir para reformar as instituições políticas e financeiras internacionais (ONU, Banco Mundial, Fundo Monetário Internacional, etc.), na linha das propostas apresentadas por António Guterres ao Congresso da Internacional Socialista em Setembro de 1996; e para assegurar uma maior coordenação das políticas económicas dentro e entre os espaços de integração regional e sub-regional das economias, nomeadamente nas políticas fiscais e na promoção de investimentos públicos supranacionais.

É preciso aproveitar e maximizar todas as possibilidades e oportunidades de fazer políticas nacionais (nos domínios macro e microeconómico, da formação e da educação, regional, social, de reorientação da despesa pública, etc.) onde há margem de manobra nacional para regular as actividades económicas e reorientar recursos, opções e prioridades a favor do emprego, da justiça social e da solidariedade.

Esta perspectiva é essencial para se dar solução positiva e harmoniosa à tríade emprego/competitividade/solidariedade.

Para «governar à esquerda», é necessário recusar as falsas antimonias entre emprego/competividade; entre competitividade/solidariedade; entre o económico e o social.

É neste domínio que se situam, porventura, as maiores divergências no seio da própria esquerda. É neste domínio onde, seguramente, a esquerda tem de lançar um olhar mais autocrítico sobre o seu tradicional e olímpico desprezo pelas condições de sustentabilidade económica das suas justas opções sociais.

A questão não é escolher entre as pessoas («o social») e a economia. Desde logo, porque só há economia na medida em que há pessoas.

Num certo sentido, como dizia Marx, a economia não é mais do que o conjunto das relações sociais que se estabelecem no processo de produção de riqueza, na distribuição e na apropriação desse produto. É, pois, nestas relações sociais e na sua interacção com a política que reside a chave da harmonização e da solução daquela equação complexa.

É nessa interacção que melhor se avaliam as diferenças e se identificam as opções de uma «governação à esquerda», a primeira das quais só pode ser pelo emprego.

Uma tal opção obriga a um novo olhar sobre o próprio conceito de emprego (a «empregabilidade») e sobre as causas do desemprego.

No desemprego, há elementos estruturais que têm a ver quer com a qualidade dos empregos quer com as qualificações necessárias para os manter. Assim como a generalização da automação, da robotização e os progressos na produtividade em todas as esferas produtivas geram, objectivamente, a necessidade de menos emprego(s) ou, em alternativa, jornadas de trabalho menores, para, pela partilha, se garantir mais emprego.

O que daqui se deduz é que não bastam atitudes ou políticas voluntaristas (embora elas sejam desejáveis e indispensáveis no curto prazo) para solucionar o desemprego estrutural.

Há, por outro lado, um problema de desemprego que é transversal e, por isso, carece de ser atacado de forma integrada e global, onde destaco as políticas de dinamização do investimento, público e privado; as políticas de ensino, formação e qualificação de recursos humanos; as políticas de sustentação e modernização das empresas que criam mais emprego, nomeadamente as PME; a coordenação supranacional das políticas económicas nos espaços regionais e sub-regionais, com o objectivo - emprego.

Discute-se muito, no seio da esquerda, a prioridade ao emprego em função, também, da condução da política macroeconómica. Nos últimos anos, ouviu-se falar da suposta contradição entre os objectivos da chamada «convergência nominal» (redução do défice orçamental e da inflação; manutenção da estabilidade cambial: participação na moeda única europeia, o euro) e o estímulo do crescimento e do emprego.

Ora, o que a condução da política económica e social, em Portugal, tem mostrado, nos últimos dois anos, é que foi possível transformar num círculo virtuoso emprego e convergência nominal e compatibilizar ambos com políticas activas de solidariedade e combate à pobreza e à exclusão.

Não restam hoje dúvidas a ninguém de que só a crescente convicção da entrada de Portugal no euro tornou possível que o crédito concedido - tanto às empresas como ao Estado - se tenha tornado mais barato, nos últimos dois anos, em mais de um terço do seu valor inicial.

Menos custos financeiros das empresas tornaram-nas mais competitivas, dando não só mais solidez aos seus actuais postos de trabalho como garantindo, seguramente, mais investimento e, portanto, novos empregos. Menos custos financeiros para o Estado - além de permitirem uma diminuição do défice orçamental, sem aumento de impostos - tornaram também possíveis uma reorientação da despesa a favor do investimento público (ele próprio gerador de emprego) e do aumento significativo das despesas sociais (RMG; despesa social passou os 50 por cento da despesa pública).

A referência a estes factores da experiência governativa de esquerda, iniciada em 1995, não se destina a fazer autoproselitismo.

Trata-se de reter uma experiência que tem conseguido, com sucesso, «casar» rigor nas finanças públicas com consciência social; compatibilizar o emprego, o investimento e a competitividade. Não quero deduzir de tudo isto nenhuma «doutrina», nem universal nem infalível, nomeadamente na condução da política macroeconómica.

Mas a verdade é que a criação deste círculo entre emprego, competitividade, solidariedade - no quadro do processo de convergência monetária para a entrada no euro - só tem sido possível em função de uma vontade política inabalável de colocar as pessoas no centro do processo económico, como é exigível a quem queira «governar à esquerda».

(*) Ministro da Economia - In «Diário de Notícias» de 20 de Janeiro



RECURSOS RENOVÁVEIS CADA VEZ MAIS

JOÃO JOSÉ AGUIAR

Há certas palavras que encerram em si um significado que ultrapassa o sentido corrente da vida humana para nos revelarem verdadeiros segredos que estão na base da sobrevivência do homem na Terra e da sua perpetuação como espécie.

Renovação é de facto um dos segredos que fazem com que o homem, apesar de ter um tempo médio de vida inferior a um século, se perpetue de pais para filhos e de filhos para netos, aperfeiçoando sempre as suas capacidades e modos de vida. Renovação não é a manutenção de cada homem para além do seu tempo de vida, mas sim a criação de um novo ser que mantém e melhora as performances do seu antecessor.

Renovação é uma característica intrinseca ao homem e a tudo o que com ele se relaciona. A renovação do próprio homem implica a renovação de todas as condições que permitem a sua sobrevivência enquanto espécie. É assim que as espécies vegetais e animais de que o homem se alimenta são também renováveis, tal como são renováveis a maior parte dos recursos que o homem vem utilizando desde a origem dos tempos.

Há cerca de 200 anos o homem começou a utilizar energias não renováveis, os combustíveis fósseis-carvão, petróleo e, mais recentemente, o gás natural. Sendo não renováveis, estas energias tenderão a esgotar-se a mais ou menos longo prazo. Para além disso, são também uma fonte de poluição que, apesar dos esforços feitos pelo homem para reduzir o seu impacto, são ainda um dos principais responsáveis pelos fenómenos das chuvas ácidas, do efeito de estufa que conduz ao aquecimento global, e da diminuição da camada de ozono.

Daqui resulta a importância crescente da utilização de recursos renováveis e de produtos recicláveis, e em particular de energias renováveis. Em Portugal, quando falamos de energias renováveis estamos a falar da energia hidroeléctrica, da energia eólica (ventos) e da biomassa (florestas).

Portugal tem condições naturais para tirar partido, de uma forma muito mais profunda do que tem feito nos últimos anos, destas três fontes de energia, pois tem várias bacias hidrográficas ainda com grandes potencialidades de aproveitamento, tem várias zonas de elevado potencial eólico e grandes manchas florestais.

A energia hidroeléctrica desenvolveu-se a partir dos anos 50 de uma forma que hoje podemos classificar de exemplar, face a outros domínios da nossa actividade industrial, através da construção de aproveitamentos que hoje fazem parte da nossa realidade, conjugando a produção de energia eléctrica com o abastecimento público de água, o regadio e outras utilizações indutriais e turísticas. Lembremos aqui o abastecimento de água a Lisboa, a partir da barragem do Castelo do Bode, e do Porto a partir de Crestuma, bem como o regadio e a regularização de cheias no rio Mondego com as barragens da Aguieira e Raiva, sem falar da navegabilidade do Douro. Situação diferente ocorre para a energia eólica e a biomassa.

Começam a ser visíveis sinais de que há uma disposição diferente deste Governo para apostar nas energias renováveis como o prova a opção clara pela barragem do Alqueva, empreendimento hidroeléctrico fundamental para a dinamização do Alentejo com aproveitamento eléctrico, agrícola e abastecimento público às populações, numa área caracterizada por secas crónicas e faltas de água frequentes. Mas também no domínio da energia eólica foi já instalado e encontra-se a funcionar o primeiro parque eólico de razoáveis dimensões na serra das Meadas, na zona de Lamego, encontrando-se já em construção um outro na serra do Marão. No dominio da biomassa vai começar a ser construída uma central de aproveitamento de residuos florestais em Mortágua.

Em resumo, podemos dizer que Renovar, na área da energia, é dar vida ao País.