AMBIENTE



Clima

CIMEIRA DE QUIOTO

Durante dez dias estiveram reunidos, em Quioto, no Japão, cerca de cinco mil representantes de governos e organizações de 160 países, numa tentativa de culminar um processo iniciado em 1990, em Berlim, alcançando o tão desejado tratado internacional legalmente vinculativo sobre as taxas de redução de emissões de gases geradores do efeito de estufa.

Mas, a tarefa dos delegados de mais de centena e meia de países não se afigurou nada fácil. Muitas divergências se apresentaram como obstáculos ao estabelecimento do consenso necessário na III Sessão da Conferência de Signatários da Convenção das Nações Unidas sobre Mudança Climática (UNFCCC-COP3).

Na base das divergências, surgidas entre os principais parceiros internacionais reunidos na cidade japonesa de Quito, esteve, desde o dia 1, a definição de uma meta em termos de taxa de redução a alcançar e os prazos para a execução.

A União Europeia (UE) defendia uma redução global das emissões de gases poluidores em 15 por cento, relativamente aos níveis registados no ano de 1990, até ao ano 2010. Por seu lado, os Estados Unidos da América (EUA) pretendiam apenas que até 2012 fossem reduzidas emissões de dióxido de carbono (CO2) para os níveis verificados há sete anos.

Recorde-se que, da parte de Portugal, no seu segmento ministerial, a ministra do Ambiente, Elisa Ferreira, falou numa conferência realizada no dia 8, defendendo o princípio da diferenciação entre países adoptado pela Europa comunitária.

Entretanto, e enquanto os parceiros europeus assinalam o recuo dos EUA, classificando a proposta apresentada por este país como «tímida», os norte-americanos alertavam para os perigos da ousadia comunitária.

Foi à vice-secretária de Estado em exercício nos Estados Unidos a quem coube a divulgação das críticas de Washington à proposta europeia. Melinda Kimble atacou, logo no dia inaugural da cimeira pelo clima, as pretensões da UE, metaforizando-as com a imagem de uma «bolha», pois tomam a União como um todo em vez de ter em conta países individuais - uma estratégia que permitia a alguns Estados-membros menos industrializados, incluindo Portugal, aumentarem, em vez de reduzirem, as suas emissões, criando o que os norte-americanos consideraram ser uma «vantagem competitiva injusta» para as suas economias.

No sentido de um reforço desta posição, um grupo de associações empresarias dos EUA divulgou um estudo que concluía que mesmo a modesta proposta que Washington levou a Quioto resultaria na perda de 1,8 milhões de postos de trabalho e a uma quebra significativa da produtividade.

Preocupado igualmente com a evolução do seu desenvolvimento e da sua economia manifestou-se um grupo de 77 países em vias de desenvolvimento, encontrando eco na posição assumida pela China, claramente antagónica com a proposta norte-americana, que sustentava a sua recusa de se comprometer a reduzir emissões de gases acusadores do efeito de «estufa», alegando ser um dever dos países industrializados darem o exemplo.

As emissões de gases que se pretendiam reduzir em Quioto, com especial incidência para o CO2, resultam da queima de combustíveis sólidos e estão directamente associadas ao processo de desenvolvimento económico, com os países em vias de desenvolvimento a usarem o argumento segundo o qual a concretização de compromissos excessivos sobre redução de tais emissões seriam catastróficos para as suas economias.

A China aparece depois dos Estados Unidos, nas estatísticas internacionais, como o segundo país produtor de gases responsáveis pelo aquecimento do planeta, apesar da proporção por habitante ser muito mais baixa comparativamente aos países industrializados.

Todavia, se a ousadia da UE era temida, por um lado, a timidez dos EUA era criticada, basicamente pelos parceiros europeus, por outro lado, com base no alegação da insuficiência, tendo em conta, mais uma vez, que os Estados Unidos são o maior poluidor mundial, sendo responsáveis por 24 por cento do total global de emissões de gases, com menos de quatro por cento da população mundial.

Finalmente, a proposta japonesa parecia reunir alguns aspectos geradores de consenso. O Japão colocou na mesa a ideia de uma redução das emissões de cinco por cento entre 2008 e 2012.

O primeiro-ministro nipónico, Ryutaro Hashimoto, contornou o principal ponto de atrito na COP3, sublinhando, especialmente, a necessidade de combater as emissões de gases nocivos responsáveis pelo sobreaquecimento planetário e a mudança do clima à escala mundial, através da inovação e do aumento da eficiência no uso da energia.

O Japão manifestou-se, inclusivamente, disposto a prestar ajuda financeira e a transferir tecnologia a favor de um envolvimento do Terceiro Mundo na luta contra a emissão de gases.

Um enquadramento dramático para as possíveis consequências do efeito de «estufa» foi dado por Kinza Clodumar, presidente da República de Nauru, no Pacífico Sul, ao referir-se ao problema da aumento das temperaturas globais e, com elas, a subida do nível dos oceanos que ameaça os pequenos países insulares.

Portugal, com uma extensa costa, 2/3 da população e do PIB concentrados no litoral, não estará, neste quadro futuro, numa situação dramática, mas o recuo da linha costeira devido à subida das águas do mar, consequência do degelo das calotes polares, é uma preocupação constante da ministra do Ambiente, Elisa Ferreira, tendo-o sido, também, no decurso da cimeira de Quioto.

Ainda em matéria de divergências entre os principais parceiros negociais presentes na COP3, destaca-se as diferenças em torno do tipo de gases considerados para a redução de emissões.

Enquanto a UE e o Japão tomavam como base de trabalho os três principais causadores do efeito de «estufa» - dióxido de carbono, o metano e o óxido de azoto -, os EUA propunham reduções num total de seis gases.

Para já permanecem as expectativas em torno à próxima conferência ambiental a nível mundial, que, ao que tudo indica, será em Buenos Aires, Argentina, nos dias 2 e 3 de Novembro de 1998.

(MJR)